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Chef Camila Figueiredo

Recém chegada da Coreia do Sul, chef Camila Figueiredo abre as portas do Restaurante Occitano para receber o BrazilKorea em uma entrevista exclusiva sobre as experiências de sua viagem gastronômica.

Seul, Anyang e Itaewon marcaram os principais percursos da viagem gastronômica de Camila Figueiredo, formada no Le Cordon Bleu Paris e chef de cozinha do restaurante Occitano em Brasília, que traz o melhor da cozinha do sul do mediterrâneo combinada a um balanceamento dos alimentos e de suas propriedades.

BrazilKorea: Pode nos contar um pouco de sua trajetória?

Chef Camila Figueiredo – Comecei a cozinhar bem cedo (talvez com uns 7 anos), ajudando em casa minhas irmãs. Sempre gostei muito de cozinhar e achava legal a ideia de reunir a família e os amigos para poder comer e como nossas reuniões envolviam comida, isso me deixava muito feliz. Então desde pequena eu brincava dizendo que seria uma ótima ideia abrir um restaurante, porque assim poderíamos dividir aqueles momentos tão preciosos com as outras pessoas.

Cresci e me mudei para o Rio de Janeiro, o tempo passou, muitas coisas surgiram ao longo do caminho e só pude entrar em contato com a gastronomia de forma profissional em 2012, onde surgiu a oportunidade de estudar fora. Fui para a França, me formei e levei como propósito o tipo de atendimento e a forma de trabalho que desenvolvo hoje na cozinha. Ao voltar para Brasília depois de muito cogitar, juntei minhas economias e decidi realizar o que eu acreditava, e assim abri o Occitano.

O Occitano surge por este motivo, como um ambiente onde eu pudesse trabalhar de acordo com o que acredito. A ideia de recepcionar as pessoas dentro de um ambiente próximo daquele que temos quando convidamos alguém para uma refeição, pra mim também é algo fundamental.

BrazilKorea: O Occitano tem como proposta um menu em constante transformação. Pode-nos contar como se dá o processo de elaboração do menu, que critérios são utilizados, sua rotatividade e qual a recepção dos clientes inclusive no que se refere a oportunidade de desfrutar de experiências gastronômicas variadas a cada período?

Chef Camila Figueiredo – Nosso menu é atualizado de três em três meses, pois procuramos trabalhar com os alimentos da época e assim, também oferecê-los a preços mais acessíveis. É uma atualização apertada, mas o nosso interesse é oferecer o melhor ao nosso cliente. Muitos clientes costumam pedir a retomada de alguns pratos, mas aproveitamos para incentivar a conhecer outros sabores que surgem com os novos menus, inclusive no que se refere a carta de vinhos. Ou seja, nossa proposta é harmonizá-los com o menu para oferecer a melhor experiência.

Além disso, o atendimento é um fator muito importante na experiência gastronômica. Tanto eu quanto o souschef costumamos passar em todas as mesas mesmo que seja apenas para desejar boas vindas os clientes. Acredito que todos devem ter acesso a cozinha e não gostaria de criar uma distância entre ela e o salão e até acho que cada vez mais eu faço questão de conhecer as cozinhas, de ver como se dá o preparo da comida, do carinho e respeito tido pelo preparo dos alimentos.

BRASIL E COREIA – INFLUÊNCIAS

BrazilKorea: Como nasce sua relação com a cultura coreana e em que medida ela passa a representar uma referência gastronômica?

Chef Camila Figueiredo – Aprecio uma alimentação mais balanceada e inclusive possuo muitas restrições, mas que como chef preciso remediá-las. No Brasil, é difícil conseguir fazer determinadas adaptações, principalmente antigamente quando ainda não se era comum essa prática, então eu passei a me atentar mais para as influências asiáticas, que se baseiam no consumo de muitos legumes, ensopados e arroz.

Já em Paris, cheguei a ter um problema de saúde por conta da forma como a comida era feita por lá, e nesse entretempo fiz amizade com uma coreana, a Ji Hye (지혜). Conversávamos muito sobre as semelhanças de ingredientes que a cozinha coreana e a brasileira tinham. Então durante a nossa estadia lá, procurei mostrar a ela um pouco da cozinha do nosso país, já que como eu, ela também tinha muita curiosidade, e assim, pude conhecer melhor também a culinária coreana indo a alguns restaurantes localizados em Paris mesmo.

Como disse anteriormente, gosto de ver a comida juntando pessoas, especialmente de nacionalidades diferentes, fazendo com que a barreira da língua não seja um problema, e os coreanos sabem muito bem como compartilhar as refeições. O fato do side dish, ou acompanhamentos, ser para eles tão importante quanto o próprio prato, também foi algo que chamou minha atenção, pois gosto bastante de fazer acompanhamentos em casa e ao saber que compartilhava esse mesmo costume, fiquei bem empolgada em conhecer suas variedades. Então a referência gastronômica veio dessa forma, não só gastronômica como cultural e histórica.

BrazilKorea – Como você vê a fusão das duas culinárias (brasileira e coreana)?

Chef Camila Figueiredo – Bom, vou comentar sobre a fusão das três culinárias (brasileira, coreana e mediterrânea). A culinária brasileira apesar de ter muitas influências, é a meu ver uma culinária relativamente nova, diferentemente da culinária coreana e mediterrânea, que são culinárias milenares. E apesar de serem milenares, elas tomaram rumos diferentes ao longo do tempo, onde a coreana ainda se mantém em essência tradicional, enquanto a mediterrânea se adaptou e se tornou a nouvelle cuisine. E confesso que essa rusticidade presente na culinária coreana, me encanta muito mais [risos]. Curiosamente, as duas culinárias vieram de períodos de escassez, então eles sabem aproveitar melhor cada ingrediente, e se nos atentarmos à influência africana na culinária brasileira, ela também nos mostra isso.

Além disso, dentro da tradição coreana, há diversas técnicas de armazenamento, aproveitamento dos alimentos, temperos e condimentos que hoje tem sido estudadas e comprovadas no que se refere aos benefícios à saúde e acredito que poderia-se investir em mais pesquisas nesse sentido. Por isso, é importante se atentar aos benefícios de cada culinária e trabalhá-los dentro da nossa, que mesmo já sendo tão rica e cheia de influencias, porque não torná-la ainda mais?

BrazilKorea – Tanto a culinária mediterrânea como a culinária coreana partilham uma riqueza de composições, bem como de aproveitamento das propriedades naturais dos alimentos, sendo consideradas grandes fontes beneficentes de saúde. Como chef e pesquisadora, como você vê ambas culinárias e que influências uma pode trazer a outra?

Chef Camila Figueiredo – Costumamos chamar esses tipos de alimentos de funcionais, onde se foca nas propriedades medicinais que eles oferecem. A culinária mediterrânea, tem feito muitas adaptações, substituindo alguns alimentos por outros com elementos mais ricos, enquanto na coreana já é mais comum no dia a dia, não precisando fazer adaptações, e diria que não só a coreana, mas a japonesa, a chinesa, a vietnamita e a tailandesa, tendem a trabalhar com base nesses aspectos de forma mais natural.

VIAGEM A COREIA DO SUL

BrazilKorea – Qual foi a principal motivação e como se deu a escolha de realizar uma viagem gastronômica à Coreia do Sul? É a primeira vez que realiza uma viagem a Seul com esta proposta?

Chef Camila Figueiredo – Eu já vinha planejando minha viagem para a Coreia do Sul há alguns anos. Amo comer e precisava tirar férias, afinal o trabalho dentro de um restaurante é muito desgastante físico e mentalmente. Como no meu curto tempo livre ando estudando a língua coreana, decidi juntar o útil ao agradável. Além disso, eu queria muito conhecer sobre o estilo de vida coreano sem a influência de turistas, por isso, optei por ficar em Anyang, localizada há 1 hora de metrô de distância de Seul e que é uma cidade em que não se vê turistas, o que pra mim em termos de experiência foi maravilhoso, não só pela língua, mas também por poder ver como eles vivem e como são os restaurantes sem a influência e a maquiagem turística, inclusive a própria forma de atendimento que é completamente diferente. Lá não era comum se falar inglês, e quando chegava aos restaurantes as pessoas ficavam impressionadas. Então eu pedia uma mesa e o prato que queria comer, e em todas as vezes fui muito bem atendida.

Em Anyang cheguei a visitar o mercado local, que não é tão grande quanto aos que se vê em Seul, mas muito bom em termos de variedade de produtos. Também fui a Suwon, e apesar de haver turistas a cidade não é como Seul, pude claro, perceber mais o fluxo de turistas coreanos a estrangeiros, e nesse sentido, a questão do atendimento também muda, até para receber o público, mesmo que local. Andei de bondinho e a vista era realmente muito bonita, caminhei pelas vilas e elas são realmente como nos Reply’s (série de dramas produzida pela tvN). Já em Seul, visitei alguns mercados e ainda ruas de compras como Hongdae. Fui numa terça-feira a noite para ver como era o movimento, e os restaurantes estavam realmente cheios e as pessoas comendo junto. Fui também a Itaewon, e visitei um pequeno restaurante onde experimentei um prato com arroz, carne assada, algas (que são muito gostosas) e ova de peixe, e apesar de não gostar muito de ova, misturei todo o prato e ficou muito gostoso.

Acervo Pessoal - Camila Figueiredo

Acervo Pessoal – Camila Figueiredo

BrazilKorea: Você teve a oportunidade de fazer cursos ou conhecer chefs coreanos?

Chef Camila Figueiredo – Tive a oportunidade de ir a um restaurante brasileiro, o Copacabana Grill, chefiado pela Joelma Kim, e lá, conversei com ela sobre sua experiência na Coreia, sua trajetória e outras questões mais administrativas e de gerenciamento.

Quanto aos cursos, fui convidada para fazer um curso, porém como ele teve a data trocada, não coincidiu com o período de minha estadia, mas estive em contato com um amigo, Ray (진혁), que trabalha na área gastronômica. Atualmente seu trabalho envolve a parte de alimentação em uma empresa de TI e quando tem tempo, dá aulas para estrangeiros, não só ensinando a fazer pratos tipicamente coreanos, mas também compartilhando um pouco da própria cultura. Um pouco do trabalho dele pode ser conferido AQUI! Ele me indicou ainda restaurantes em Itaewon para comer churrasco coreano e conhecer pratos locais, e em termos de gastronomia foi uma experiência muito rica.

Pretendo ainda voltar a Coreia, já falando a língua e então buscar entrar em contato com chefs. Porque acredito que estando lá pra falar sobre a cultura deles e da culinária deles, tratando diretamente na língua deles ganharei muito, até porque infelizmente com a tradução, muita informação se perde.

BrazilKorea – A culinária coreana reflete a forte essência cultural de seu povo. Como chef, que percepções você têm desta relação e das particularidades desta culinária?

Chef Camila Figueiredo – Como chef e trabalhando no Brasil, mais precisamente em Brasília, preciso me adaptar ao paladar local. Algumas coisas na gastronomia coreana, ainda são distintas ao paladar brasiliense, ressalvando aqueles que já conhecem e gostam desse lado da cultura asiática. Alimentos fermentados, variedade do uso da pimenta e de produtos mais exóticos, a forma como eles os apresentam e a importância de cada detalhe, os costumes que envolvem o momento da refeição. Enfim, a culinária não envolve somente a comida, ela está ligada diretamente com a cultura e história do local, assim como em todas as outras culinárias.

BrazilKorea – Que pratos mais marcaram seu paladar no que se refere a experiência culinária na Coreia do Sul?

Chef Camila Figueiredo – Todos! [risos] Tudo que eu comi lá foi bem marcante, das sopas tradicionais até as famosas por curar a ressaca (que são muito saborosas e simples de fazer), os macarrões frios que são muito bons, apesar de estarmos acostumados a massas diferentes, além disso, vários tipos de acompanhamentos, doces com pasta de feijão azuki, o querido barbecue que vemos nos dramas, enfim, foram vários pratos. Alguns tive a oportunidade de repetir, como por exemplo o 삼계탕, 시래기 된장국, Topokki (떡볶이), Kimbap (김밥), Kimchi (김치), Nengmyeon (냉면), Japchê (잡채), entre outros. Queria ter ficado mais tempo, assim poderia ter aproveitado melhor essa culinária tão especial que não só proporciona uma boa alimentação, como também nós ensina muito com a sua historia e cultura.

Acervo Pessoal - Camila Figueiredo

Acervo Pessoal – Camila Figueiredo

BrazilKorea – De volta ao Brasil, já foi possível criar um prato que trabalhe com a fusão das culinárias mediterrânea e coreana?

Chef Camila Figueiredo –  Há a ideia do prato que citei anteriormente que acompanha arroz, carne assada, algas e ovas de peixe que experimentei lá e gostaria de trabalhar com o sabor e trazer para o Occitano. Percebi também nas feiras e mercados que eles costumam colocar pera e outras frutas na carne. E por isso comecei a pensar sobre combinações utilizando esses sabores. Atualmente estou estudando e testando algumas formas de adaptar alguns sabores em pratos futuros, tentando fazer essas adaptações no cardápio, sempre priorizando a acessibilidade do preço e a utilização de ingredientes daqui, para incorporar também aos pratos, referências de lá.

SERVIÇO

Restaurante Occitano
Endereço: CLS Quadra 215, Bloco A, Loja 37 – Brasília – DF 71.294-510
Aberto ao público de Quarta à Sábado de 19h às 23h e Domingo de 12h às 15h
Atendimento para reservas e eventos: Terça à Sábado de 16h às 20h
Pelos e-mails: [email protected] | [email protected]
Pelos telefones: (61) 3345-6042 | (61) 9880-9008 | (61) 9964-3516

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Agradecimento: À Chef Camila Figueiredo por receber o BrazilKorea de portas abertas, à Marcia Prado e ao Glêner Piantino.
Entrevista e Redação: Bárbara Brisa e Laryssa Miranda

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About Barbara Brisa

Editora de conteúdo (Brasília) - Cientista Social pela Universidade de Brasília, Repórter Honorária pelo Centro Cultural Coreano do Brasil e Co-Fundadora do Maūm Ūmsik. Em constante estudo pela compreensão das coreanidades.

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